A fúria dos animais no cinema
Peixes famintos da estreia "Piranha 3D" não são os únicos a assustar as plateias
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"Piranha 3D" recupera o filme cult de 1975 em que garotas de biquíni são atacadas pelo cardume faminto
Histórias em que animais se voltam contra a humanidade sempre chamaram a atenção do público - independentemente de sua qualidade ou verossimilhança. Quem nunca se assustou com o tubarão rondando a praia, as aranhas invadindo casas ou o crocodilo aterrorizando os esgotos?
A estreia de "Piranha 3D", longa em que jovens de biquíni são atacadas pelos peixes famintos, é apenas mais um capítulo da série de filmes em que os vilões não são psicopatas ou criminosos, mas animais sedentos por vingança contra os homens.
A história mais influente de terror protagonizado por um animal é o romance "Moby Dick", de Herman Melville, que relata a trágica jornada do capitão Ahab em busca da baleia branca conhecida como Moby Dick - que já havia atacado outros baleeiros e arrancado a perna do marinheiro.
Dirigida por John Huston e estrelada por Gregory Peck, a mais famosa adaptação de "Moby Dick" para o cinema chegou às telas em 1958 e influenciou um dos maiores clássicos cinematográficos do gênero: "Tubarão", realizado por Steven Spielberg em 1975.
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Foi o sucesso do suspense "Tubarão", de 1975, que impulsionou o gênero dos animais em fúria no cinema
O cineasta admitiu que gostaria de ter apresentado o personagem Quint, papel de Robert Shaw em "Tubarão", enquanto o mesmo assistia ao clássico dos anos 50 e ria de Ahab - sem imaginar que estaria diante de uma situação parecida. Mas para sua tristeza a utilização das cenas de "Moby Dick" foi vetada por Gregory Peck, alegando insatisfação com sua atuação.
Isso não impediu que "Tubarão" se tornasse um sucesso, talvez só perdendo em prestígio para "Os Pássaros", filme dirigido pelo mestre do suspense Alfred Hitchcock em 1963. Apesar da estranheza - afinal, centenas de pássaros não têm o costume de atacar pessoas pelas ruas - o longa é um dos mais aclamados da lista do cineasta.
No rastro do tubarão
Como ocorre habitualmente em Hollywood, o sucesso de um filme acaba inaugurando um gênero e estimulando dezenas de produtores a apostar seus recursos em roteiros que seguem uma mesma linha, mas de qualidade duvidosa. Foi exatamente o que aconteceu após o lançamento de "Tubarão".
Em 1977 o produtor Dino De Laurentiis colocou dois genéricos do filme de Steven Spielberg nos cinemas. O primeiro foi "O Grande Búfalo Branco", fita em que o ator Charles Bronson interpreta o pistoleiro Wild Bill Hickok, que em 1874 retorna ao Oeste dos Estados Unidos em busca do tal búfalo branco - animal que, além de aterrorizar os índios, é figura constante em seus pesadelos.
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"Orca - A Baleia Assassina" é apenas uma das produções que surgiu logo na sequência de "Tubarão"
Enquanto "O Grande Búfalo Branco" parecia transpor "Moby Dick" para os westerns, a produção "Orca - A Baleia Assassina" não tinha vergonha de "inspirar-se" no blockbuster de 1975. Estrelado por Richard Harris, o filme conta a história de uma orca macho que, após testemunhar a morte de sua companheira, decide vingar-se de capitão e tripulação do navio que a capturou.
No ano seguinte surgia "Piranha", produzido por Roger Corman que, ao contrário dos demais, usava a premissa de "Tubarão" num contexto levemente paródico, em que piranhas de um experimento militar eram acidentalmente jogadas no lago onde famílias divertiam-se durante as férias.
Ainda em 1978 era lançado "O Enxame", cujas grandes vilãs eram milhares de abelhas que invadiam o Estado do Texas. Seu ator principal, o britânico Michael Caine, chegou a dizer que esse é o pior filme de sua carreira - o que não deixa de ser um título disputado, afinal Caine faz parte do elenco de filmes como "Tubarão IV – A Vingança" e "Dramático Reencontro no Poseidon".
A década de 70 acaba com "Alligator - O Jacaré Gigante", que conta a triste história de Ramon, um filhote de crocodilo que, após ser jogado privada abaixo, passa 20 anos se alimentando de cadáveres de animais modificados geneticamente e, por isso, alcança fantásticos 11 metros de comprimento.
A história de Ramon encerra essa primeira leva de filmes inspirados pelo sucesso de "Tubarão", que ainda conta com uma menção honrosa ao longa brasileiro "Bacalhau", dirigido por Adriano Stuart em 1976. Nele, um bacalhau da Guiné aterroriza os habitantes de uma cidade balneária no litoral de São Paulo - um verdadeiro clássico da cinematografia nacional.
Em comum, todos esses filmes têm o uso precário da tecnologia na construção de seus vilões, em sua maioria criaturas risíveis e distantes da realidade. Por causa disso, não foi com surpresa que as platéias reagiram quando a indústria cinematográfica abandonou aos poucos o gênero.
O tímido retorno dos animais furiosos
Após uma década sem grandes produções com vilões do reino animal - tendo como exceção "Razorback - As Garras do Terror", filme australiano em que um javali gigante destrói casas e devora pessoas -, os anos 90 tentaram recuperar o gênero com produções que fugiam dos predadores marinhos e de outros animais datados.
Logo no início da década surgiu "Aracnofobia", dirigido por Frank Marshall e estrelado por Jeff Daniels, que interpreta um médico aracnofóbico - com muito medo de aranhas - que é obrigado a enfrentar um batalhão de insetos de oito patas. Além da invasão de centenas de aranhas em sua casa, o filme ficou marcado pela cena em que uma adolescente toma banho e é quase atacada.
Os animais voltaram a atacar os cinemas em 1996, com a estreia de "A Sombra e a Escuridão", em que Michael Douglas e Val Kilmer enfrentam a dupla de leões que ameaçava a construção de uma ponte entre o Quênia e Uganda no século 19. De acordo com a trama, baseada em fatos reais, os felinos mataram mais de 130 pessoas até serem eliminados.
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Os atores Anthony Hopkins e Alec Baldwin em cena de "No Limite": ao menos nesse filme o urso convence
No ano seguinte, dois animais distintos entraram para a lista hollywoodiana: Em "No Limite", estrelado por Anthony Hopkins e Alec Baldwin, um urso experimenta carne humana pela primeira vez e, satisfeito com a experiência, tenta fazer dos protagonistas sua próxima refeição.
Já em "Anaconda", um grupo de documentaristas norte-americanos (entre os quais se encontra a então desconhecida Jennifer Lopez) dá azar e cruza o caminho de um caçador que quer capturar a mítica serpente de 12 metros a qualquer custo - recuperando todas as precariedades das produções da década de 70.
Agora é a vez de "Piranha 3D", quarto filme estrelado pelos peixes carnívoros (o original foi seguido por uma sequência em 1981, "Piranha 2: Assassinas Voadoras", dirigido por James Cameron, e já havia ganhado um remake em 1995) tentar reavivar o gênero e quem sabe garantir novos dissabores aos humanos nas garras, dentes ou caudas dos animais - fato dado como certo após o sucesso nas bilheterias: "Piranha 3DD" já está garantido.
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